sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Vila Madalena: um pseudo-universo


Conhecida pela intensa vida noturna e também por ser reduto de intelectuais e artistas de todas as espécies, a Vila Madalena, ao longo dos últimos anos tornou-se irreconhecível para aqueles que a conhecem há muito tempo, nascidos ou não no local.

Quando digo há muito tempo, refiro-me a um período de aproximadamente 30 anos atrás, na época em que seus habitantes e personagens faziam a imagem do bairro, e não o oposto, que é justamente o que ocorre hoje em dia.

Naqueles velhos tempos, a personalidade da Vila era consequência natural do modo de vida de seus habitantes, que por motivos variados por lá aportaram em algum momento; artistas, músicos, hippies, gente atrás de um pouco de sossego e opções alternativas de vida. Aliás, naquela época nem existia a palavra "alternativa" no sentido que é usada hoje em dia, que significa atualmente "aquilo que ninguém gosta, mas aqueles que se dizem alternativos afirmam gostar, só para se declararem diferentes".

Ora, neste ridículo esforço para parecerem diferentes, os ditos alternativos atuais, também conhecidos como "da Vila", acabaram formando uma tribo que em nada difere daqueles outros que são considerados por eles como "povão". Claro, os que se consideram "da Vila" são mais descolados, intelectuais, conhecem tudo que o povão ignora, julgam pertencerem a uma classe especial que aprecia coisas que só são compreensíveis por uma minoria genial, e que os outros não passam de simples desmiolados que gostam do que todo mundo gosta, ou seja, não têm personalidade.

Acontece porém, que consciente ou inconscientemente, ao criarem uma espécie de "griffe" comportamental, os que se dizem "da Vila" igualaram-se àqueles que desprezam, apenas mudou-se a roupagem.

O que é mais patético do que ouvir um típico diálogo de um representante da Vila?



"Você já ouviu o último CD do Antonino Aparecido Cruz Credo da Conceição? Aquilo sim que é música!"

"Nossa, demais, põe no chinelo qualquer cantorzinho tipo esses aí que tocam na rádio."

"Pois é, mas fazer o quê, o povão ainda não está preparado para apreciar um artista desse nível, coitadinhos!"



O mais engraçado de tudo isso é que geralmente um artista cultuado pela elite Vila-Madalenense é um pseudo-artista fracassado, mas a culpa não é dele, e sim, do povo, que não possui neurônios suficientes para compreender tão elevada forma de expressão artística. Curiosamente, isto geralmente é afirmado pelas mesmas pessoas que dizem que o artista e a arte pertencem ao povo.

Obviamente que existem diferenças entre manifestações culturais; é praticamente unanimidade que não se pode comparar uma sinfonia de Beethoven com as músicas do Genival Lacerda. A primeira é fruto de pensamentos e aspirações elevadas, que transcendem o espírito humano, enquanto a segunda é apenas um reflexo de sentimentos mais próximos do instinto de perpetuação da espécie do que qualquer outra coisa.

Serei sincero: não gosto das músicas do Roberto Carlos, não porque não sejam boas, afinal, tudo aquilo que cumpre a finalidade para a qual foi feita pode ser considerada boa, e neste quesito Roberto Carlos é insuperável. Apenas não me agradam manifestações melosas de paixão, mas isso não me impede de respeitá-lo como artista, e declaro que ele merece estar aonde está, pois ele é realmente bom.
Acho extremamente hilariante uma suposta elite intelectual dizer gostar de coisas que ninguém mais gosta apenas para se auto-endeusarem e colocarem-se num pedestal inacessível para aqueles que não são iniciados na genialidade artística só encontrada naqueles que são "da Vila". O povo é uma besta e eles são os eleitos. Mas ainda algum habitante "da Vila" há de falar em alto e bom som, com uma expressão entediada bem característica:

"Toda unanimidade é burra."

Sim. Inclusive aquela que considera Machado de Assis um grande escritor, Al Pacino um irretocável ator, Da Vinci uma mente brilhante muito além de seu tempo. Totalmente compreensível.
Afinal de contas, nenhum deles são "da Vila Madalena."

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